A ARTE CRITICA A VIDA II
.
"Um vestiário de um time de futebol de várzea não saberia proferir vocabulário mais chulo", disse-me um amigo, e fui procurar ver um trecho da tal reunião na íntegra. Constatei que o pior de tudo é que os palavrões (1 a cada 4 ou 5 palavras) eram os menores dos problemas ante a chuva de desmandos, de malfeitos, de “jeitinhos brasileiros”, de falta de transparência nas conversas cifradas, nas vomitadas de ódio, nas perigosas ameaças veladas, e nas mais violentas e escancaradas arrogâncias. Queria eu poder ter sido poupada dessa vergonha alheia (de um alheio que, certamente, não tem um pingo de vergonha), e ter que explicar para uma filha adolescente que, definitivamente, esse não é o que se espera do primeiro escalão do governo de um país; que tudo aquilo só podia ser fake...
.
A "vibe" estava mais pesada do que o subnível do vocabulário. Se fosse fake, se fosse um filme, estaria mais para uma reunião de mafiosos articulando quais cabeças iriam rolar, antes que um parente/amigo do Poderoso Chefão fosse desmascarado. Talvez Francis Ford Copolla precisasse ter feito um laboratório naquele gabinete para dar ainda mais autenticidade à sua trilogia. Sem contar com a participação pra lá de especial da única “ministra-dama”(?) naquela mesa, que muito se assimilaria com a mãezona-lenda da sétima arte, que protagonizou outro filme como chefe de quadrilhas, Ma Barker.
.
Mas não era cinema, era mundo real, era um gabinete de ministros de um país prestes a se tornar campeão no ranking COVID-19 (em alguns segmentos já se tornou). Não falavam em vidas, em proteger pessoas, em planos emergenciais... falavam em políticas de censuras, de punições aos contraditórios, prisões infundadas, morais duvidosas, falavam até em se aproveitar da distração da imprensa para vender mais um pedaço do meio-ambiente. Sim, porque nesse gabinete-manicômio, estilo comédia nonsense ou teatro de absurdos, o ministro de meio-ambiente menospreza ecologia; a ministra das mulheres nos subjuga como idiotas; o ministro da saúde terá que adular a cloroquina; o Presidente da fundação Palmares nega existência de racismo e até simpatiza com a escravidão; a secretária da cultura disse que nem conhecia Aldir Blanc (então para que notinha de pesar?); o ministro da educação ... esse então é “impreCionante” como simplesmente não a tem.
.
E esse curta de mau gosto, de roteiro inverossímil, é o único assunto que tem conseguido roubar a cena de metade dos noticiários brasileiros, em detrimento ao horror da pandemia. Um longa-metragem mostrando Lord Valdemort “conjurando” contra o mundo dos humanos, ou ainda Darth Vader vociferando com seus Stormtroopers querendo dominar o mundo, não seriam mais amorais, nem nos causariam tamanha comoção. Enfim, tomara que essa história acabe logo e, como no cinema, os vilões sejam desarticulados. Enquanto isso, talvez Quentin Tarantino tenha que estagiar nesse gabinete, quando desejar produzir Pulp Fiction II (fica a dica).
Obs: comparar com a ficção do cinema foi uma alternativa menos agressiva que consegui fazer a minha crítica e mostrar a minha indignação. Que me desculpem os profissionais da 7ª arte, pela comparação com essa choldra.
(artigo publicado no Facebook)
Leila Marques